Resumo: Este trabalho possui a finalidade de criar um
debate acerca da correta interpretação do artigo 37, X, CF/88, demonstrando que
a revisão geral anual é automática e independente de lei ou prévia dotação
orçamentária, razão pela qual, sem ferir a Súmula 339 do Colendo STF, o Poder
Judiciário pode e deve impor a imediata implantação das revisões suprimidas e
suas correspondentes condenações pecuniárias.
I- INTRODUÇÃO
Após a Emenda Constitucional n° 19/98, o artigo 37, X, da
CF/88 passou a estabelecer que "a remuneração dos servidores públicos e o
subsídio de que trata o §4° do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados
por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada
revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices."
Tal artigo acabou tendo duas interpretações distintas pelo
Colendo STF:
a)Num primeiro momento, quando do julgamento do RMS 22307/DF
em 1997, [01] a Suprema Corte pacificou o entendimento de que o
artigo 37, X, é auto-aplicável, independe de lei específica, tendo em vista
haver gritante distinção entre os institutos aumento e revisão. Restou
pacificado que a revisão remuneratória não altera (aumenta) a remuneração,
apenas restabelece um status quo ante, agindo como verdadeira
correção monetária, visando tão somente fazer uma recomposição das perdas
inflacionárias. Assim, a Suprema Corte destacou que apenas nos casos de
alteração (aumento) é que haveria a necessidade de lei específica e de prévia
dotação orçamentária.
b)Porém, num segundo momento, quando do julgamento da ADIN n°
2061/DF em 2001 [02], a Suprema Corte adotou outro posicionamento,
oposto ao primeiro, anunciando que para haver a revisão remuneratória seria
necessária a elaboração de lei específica a ser desencadeada anualmente pelo
Presidente da República e de prévia dotação orçamentária, razão pela qual,
apenas enviou mensagem ao Executivo neste sentido, deixando de impor a imediata
implantação das revisões remuneratórias suprimidas e a correspondente condenação
pecuniária.
Este singelo artigo se destina a indagar qual destes
posicionamentos deve prevalecer. Entendo que a primeira posição adotada pela
Suprema Corte é a correta e que a segunda surgiu de uma interpretação equivocada
do artigo 37, X, gerada pelo próprio objeto da Ação Direta de
Inconstitucionalidade por Omissão, cuja causa de pedir foi a aludida declaração
de inconstitucionalidade por omissão legislativa.
II- A ORIGEM DA CONTROVÉRSIA
A redação original do artigo 37, X, CF/88 estabelecia que:
"a revisão geral da remuneração dos servidores públicos, sem distinção de
índices entre servidores públicos civis e militares far-se-á sempre na mesma
data". Conforme observado pelo professor Alexandre de Moraes, tal artigo
garantia tão somente a simultaneidade de revisão, mas não a periodicidade.
[03]
A Emenda Constitucional n° 19/98 introduziu dois importantes
comandos no supracitado artigo constitucional: a) a exigência expressa da
reserva de lei para a fixação e alteração de vencimentos e subsídios dos
servidores, observada a iniciativa privativa em cada caso b) periodicidade anual
da revisão.
Desta forma, conforme já adiantado, com o advento da EC 19/98
o artigo 37, X, CF/88 passou a receber a seguinte redação: "a remuneração dos
servidores públicos e o subsídio de que trata o §4° do art. 39 somente
poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a
iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual,
sempre na mesma data e sem distinção de índices." (grifo nosso)
Em virtude da referida emenda constitucional ter estabelecido
a periodicidade anual para a concessão da revisão remuneratória e do Presidente
da República ter se omitido em concedê-la, o Partido dos Trabalhadores resolveu
ajuizar a ADIN sob o fundamento de ter havido uma omissão legislativa do Chefe
do Executivo, o que, no meu entender, contribuiu para gerar a confusão de
posicionamento pelo Colendo STF. Não houve omissão legislativa, mas sim,
descumprimento de uma determinação constitucional.
A fundamentação da ADIN foi no sentido de que o Presidente
deveria ter desencadeado o processo legislativo anualmente para que houvesse a
concessão das revisões remuneratórias. No entanto, conforme restará adiante
demonstrado, entendo que houve uma interpretação equivocada do artigo 37, X,
CF/88, tendo em vista que o seu primeiro comando pré-determina a existência de
lei específica apenas para os casos de alteração (aumento) de remuneração
e não para a concessão de revisão de remuneração, sendo certo tratarem de
institutos diversos.
Destarte, através da citada ADIN n° 2.061/DF, a Suprema Corte
acabou declarando a inconstitucionalidade por omissão do Excelentíssimo Senhor
Presidente da República pelo fato do mesmo não ter desencadeado o processo de
revisão remuneratória dos servidores públicos federais após a EC 19/98. Em
virtude deste julgamento a Corte Maior apenas enviou mensagem ao Poder Executivo
informando sobre a necessidade de anualmente ser concedida revisão remuneratória
aos servidores públicos federais, a contar de junho de 1999, ou seja, um ano
após a promulgação da EC n° 19/98. Posteriormente, foram julgadas várias ADIN’s
pela Suprema Corte onde foi enviada a mesma mensagem aos chefes do Poder
Executivo de diversos Estados deste país. [04]
No entanto, está na hora de ser revisto o equívoco, tendo em
vista que o Poder Judiciário pode e deve determinar que o Chefe do Executivo da
União, dos Estados Membro, do Distrito Federal e de cada Município deste país,
implemente imediatamente as revisões remuneratórias suprimidas ou concedidas
parcialmente aos seus funcionários públicos.
III- A REVISÃO REMUNERATÓRIA É AUTOMÁTICA, INDEPENDE DE LEI E DE PRÉVIA DOTAÇÃO ORÇAMENTÁRIA
Ouso em descordar do último posicionamento adotado pelo
Colendo STF, no sentido de que a revisão remuneratória anual depende de lei, e
que, portanto, a determinação de sua concessão pelo Judiciário ofenderia a
Súmula 339. [05]
Com todo respeito aos provectos Ministros do Egrégio STF: a
revisão remuneratória independe de lei e de prévia dotação orçamentária, é
automática, anual, assim como ocorre com o pagamento das férias e do 13°
salário, por exemplo.
Conforme já afirmado, o entendimento de que o Presidente
precisaria desencadear o projeto de lei surgiu de uma equivocada interpretação
do artigo 37, X, CF/88. Tal artigo possui dois comandos distintos: o primeiro se
refere à alteração, que em virtude da irredutibilidade de
vencimentos, significa aumento. Apenas neste caso de alteração
(aumento) é que há a exigência de prévia dotação orçamentária e de lei
específica. O segundo comando se refere à revisão, que conforme
restará adiante exposto, trata-se de instituto diverso de aumento e independe de
prévia dotação orçamentária e de lei específica.
O aumento de vencimentos está intimamente relacionado à
discricionariedade do administrador, que decide quando há a oportunidade,
necessidade e conveniência de conceder um reajuste. Assim, em virtude da total
imprevisão quanto à data e ao índice da concessão, é que o aumento dependerá de
prévia dotação orçamentária e de lei específica, sob pena de gerar enorme
colapso nas contas públicas. Por outro lado, a revisão remuneratória é altamente
previsível: deve ser concedida anualmente para o funcionalismo público dos Três
Poderes e em índice capaz de recompor as perdas inflacionárias.
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